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Slow Living: é pra você como é pra mim?


Deparei-me pela primeira vez com o termo ‘slow living’ numa consulta médica. Justo vendo o estado da minha tireoide que, ao que descobri, já entendia do assunto bem mais e melhor que eu.

Nas tantas da consulta, comento com a doutora que morava há quadras do meu trabalho. Que ia a pé a ele. Que havia escolhido seu consultório pela proximidade (o ego dela deve ter descido uns dois degraus da escada do céu, tadinha). Que, na verdade, não precisava mais do carro pra quase nada. “Veja que luxo, doutora. Em plena São Paulo!”. Ela me olha com aquele olhar que as pessoas fazem quando meio que não acreditam, meio que invejam. Ela e eu sabíamos que aquilo não era pra qualquer um. Eu não era rica. Não tinha um título de doutora. Não ganhava uma fortuna. Mas era como se tivesse tudo aquilo. Porque andava a pé. Olha a inversão de valores! Rico antigamente era quem pegava o carrão pra comprar pão na esquina. Hoje isso anda quase tão careta quanto a palavra careta e o pão com glúten. Ela encerra a consulta, me cobra ainda meio que engolindo o “pela proximidade... hã!” e comenta que eu havia aderido ao slow living. Slow living? Aderi a um movimento sem saber?

E não é que parecia isso mesmo? Talvez até tenha me levado por uma onda de mensagens subliminares. Mas na minha cabeça eu só queria paz. 


Não queria pegar carro em SP. Trânsito pra trabalhar todo dia. Queria descer do prédio, atravessar a rua e tomar café na padaria. Não café de paulista, em pé. Sentada, como boa descendente de alemão. Queria fazer uma feirinha no final de semana. Ir ao mercado logo ali. A pé. Tudo a pé. 

E acho que queria mais. Porque quando a gente começa a andar, também começa a notar outras coisas. O sol pega mais forte na pele. O barulho de tudo fica mais alto. A gente percebe que tem saguis nos fios de luz. Que as pessoas se olham quando se cruzam nas calçadas. Cumprimentam ainda. Ou não. A dona da confeitaria te chama pelo nome. 


Mas não é só romantismo, não. Se a gente sai mais tarde do trabalho, anda também com mais medo. Dias de chuva são mais molhados e, às vezes, os de sol ainda mais.


Outra mudança é nas nossas escolhas de roupas. Antes, olhava pra dentro e por fora de mim e pra dentro do armário, de acordo com a estação. Agora é pra dentro e por fora de mim, pra dentro do armário e pra fora da janela. Além da estação, tem que ver se está sol, nublado, se vai chover, se tá ventando. A gente começa a se vestir de acordo com o tempo de verdade – não aquele do ar condicionado. A valorizar os sapatos de couro, que duram.  Sapato que aperta só sai no máximo duas vezes do armário. Pra nunca mais.  Os saltos altos viram quase piada de mau gosto. Vai notando que as calças gastam entre as pernas se você estiver acima do peso (eu – problema de tireoide, lembra?). De tanto cortar calças, nem compro mais shorts. Mesmo que a gente teime, blusa preta no sol não rola. Saias justas? Sobem. Saias longas balançam que é uma beleza. Em dias de ventinho... hum... coisa boa! 

O corpo ganha espaço de querer. E nesse espaço-tempo em que o corpo em relação ao mundo real é rei, tudo, tudo tem que ser mais orgânico, mais confortável, mais durável. Mais inteligente.

Ainda não sei se é este mesmo slow living que as pessoas estão buscando. Talvez muitos embarquem nessa ‘onda’ como o que é e descubram que não era a sua praia. Que a versão glamour do comercial de ecovila é bem menos romântica na versão ‘vida real’. E ainda prefiram o mundo mais plastificadinho e embaladinho das caixas que vivemos. Eu não. 

Pra mim, há na simplicidade e no contato tête-à-tête com as coisas, uma lembrança de quem somos na essência. De que temos sentidos mais apurados. Sentimentos mais delicados. Corpos que reagem ao tempo. E que isso não tem nada de mal. Que venha o tempo. Com chuva, com sol, com gente, bicho e ruído. E devagar. Porque tudo isso precisa do seu próprio tempo.


Conhece os comerciais da Carte Noire? Só o slow para mostrar certas delicadezas.
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